sábado, 17 de março de 2018

Chumbo se alastra um mês depois de vazamento em rio do Pará-Barcarena

Contaminação provocada pelo vazamento de efluentes da Hydro (Foto: Divulgação)
Contaminação provocada pelo vazamento de efluentes da Hydro (Foto: Divulgação)

Um mês após o despejo irregular de efluentes da refinaria norueguesa Hydro Alunorte, em Barcarena, nordeste do Pará, o chumbo já se espalhou pelo rio Murucupi, segundo análise feita pelo Instituto Evandro Chagas (IEC). A água lançada nos rios do polo industrial da cidade, segundo a própria empresa, pode conter vestígios de bauxita e soda cáustica.

Uma outra coleta foi feita a 1,3 quilômetros do local do despejo e outra a 2,5 quilômetros, revelou ao G1 o pesquisador do instituto Marcelo de Oliveira Lima. Segundo ele, as amostras indicaram que o chumbo lançado pela empresa se diluiu nas águas naturais.

"Foi encontrado um nível de chumbo alterado, porque não era para apresentar esses níveis naquela região. Então, esse chumbo pode chegar a longas distâncias e também pode ir depositando no segmento de chumbo pelo caminho".

Lima disse que já foi feita uma nova coleta em toda a região, incluindo diferentes pontos ao longo dos igarapés atingidos. Um novo relatório deve ser divulgado na próxima semana, afirmou. Ele explica que ao mesmo tempo, também ao longo desse período, foram feitas várias coletas dos tipos de efluentes a pedido do Ministério Público e também da perícia ambiental que será divulgado junto com esse relatório.

“Foram feitas várias outras investigações nesse período. Inclusive coletamos amostras no novo canal descoberto pela força tarefa do MP. Isso é feito para compreender o que estava sendo jogado desse canal no rio”.

Ainda de acordo com o pesquisador, a avaliação preliminar, que havia apontado os níveis de alumínio, nitrato e fósforo acima dos níveis permitidos, foi realizada a partir de coletas somente na água superficial de igarapés na região do polo industrial de Barcarena. "O que foi encontrado dentro da empresa no despejo do dia 17 foi um nível de chumbo cinco vezes maior do previsto na legislação, no dia 19 até duas vezes maior. Isso ao ser liberado ao meio ambiente pode chegar a um nível de chumbo três vezes maior que o previsto na legislação ambiental", explica.

Ainda não se sabe a extensão e a gravidade da contaminação, diz Ibama

O lançamento dos efluentes contaminou rios e igarapés com altos níveis de alumínio e chumbo e atingiu comunidades quilombolas e ribeirinhas pelos cursos dos rios Murucupi e rio Pará. No entanto, ainda não se sabe a extensão e a gravidade da contaminação, de acordo com o Instituto Brasileiro do Meio Ambiente e dos Recursos Naturais Renováveis (Ibama).

A Justiça determinou, então, que a empresa reduzisse a produção pela metade depois que, em fevereiro, dois escoamentos sem licença ambiental foram feitos por um duto clandestino para o rio Murucupi - um no dia 17, e outro no dia 19. Além desses, um novo despejo por um canal direto para o rio Pará foi descoberto no dia 9 de março.

O IEC e o Instituto Brasileiro do Meio Ambiente e dos Recursos Naturais Renováveis (Ibama) ainda continuam levantando os impactos que podem ter sido causados pelos despejos da refinaria. O IEC informou que já possui um novo relatório a ser divulgado na próxima semana informando o caminho que o chumbo pode ter percorrido nos rios e sobre o novo canal encontrado pela força tarefa dos ministérios do Pará (MPPA) e Federal (MPF). O Ibama também disse que irá apresentar as conclusões sobre as últimas vistorias feitas na área.

O Ibama considera o laudo que confirmou os vazamentos, divulgado ainda em fevereiro, 'inconclusivo quanto à fonte da contaminação, sua extensão ou gravidade". Em vistorias, o órgão disse que, ao invés de vazamentos, foi comprovada a existência de um escoamento de águas da chuva não previsto na licença ambiental e de um depósito de rejeitos em plena operação que dispõe de autorização apenas para a realização de testes. Ou seja, o escoamento foi na verdade, como diz a empresa, uma "liberação controlada".

A própria direção internacional da empresa admitiu que realizou o despejo, mesmo sem licença, por meio de uma descarga controlada do Canal Velho, que fica ao lado da estação de tratamento dentro da área da refinaria. A empresa negou o acidente ambiental e disse à imprensa que "não possui indícios de vazamento ou transbordo das áreas de depósito de resíduo de bauxita".


A coloração avermelhada das águas da chuva que se espalharam em Barcarena, provocaram temor nas comunidades do município. As imagens do que seria um aparente vazamento de rejeitos da barragem da empresa Hydro (Foto: Ascom/Semas)

Problemas antigos

O rio Murucupi tem nascente próxima das bacias da Alunorte. Os moradores dessa região - chamada de polo industrial - convivem não somente com os despejos de refinaria. Líderes das comunidades dizem que os igarapés e rios, que são transporte, fonte de alimento e, ainda, lazer para crianças, são impactados pelo lixo, rede de esgoto e diversas situações de exploração ambientais pelas grandes empresas que atuam na região.

Petrolino Alves é membro do Grupo de Trabalho que representa nove comunidades da área industrial em processo de indenizações e possíveis remanejamentos. Segundo ele, as comunidades próximas ao rio Murucupi ainda sofrem com o lixão, que armazena, além do lixo da cidade, os cadáveres dos bois naufragados em Vila do Conde.

Ele explica que há um projeto para um aterro sanitário para atender os municípios de Barcarena, Abaetetuba, Igarapé-Miri e Moju, mas os gestores estão aguardando a efetividade de todos os municípios para estabecer um consórcio. Segundo ele, um plano de construção seguindo os padrões técnicos exigidos já até foi realizado, mas o aterro nunca foi concretizado.

"Enquanto isso, as comunidades próximas ao lixão e dessas indústrias sofrem com a penetração de resíduos no solo que atinge os poços. A água fica contaminada profundamente, não só com bactérias e coliformes fecais, mas por esses metais pesados, como o alumínio, chumbo - que está em maior quantidade, quanto outros como mercúrio, bário, em menor escala", analisou.

Outro problema apontado pela associação dos moradores é a carga dos esgotos da Vila dos Cabanos, que não possui estação de tratamento e vai direto para o rio Pará. Uma dessas comunidades é chamada de Rosal, que convive com uma água totalmente contaminada.

Nesses locais, as pessoas apresentam coceiras, dores no estômago, diarréias, principalmente as crianças. "A problemática não é só da empresa. Mas esse problema do esgoto começou quando essas empresas se instalaram em Barcarena, porque a Vila dos Cabanos foi pensada para abrigar os funcionários. E eles nem moram mais lá. Tudo isso soma à exploração em Barcarena".

"O ponto inicial atinge esses igarapés de pequenas comunidades mas só que essa nascente chega até o rio Pará e ao se alastrar pode atingir até o rio Guamá, que abrange inclusive a capital do estado", apontou.

Em nota, a Hydro disse que está desenvolvendo um estudo para determinar a linha de base ambiental dentro da área de influência da Alunorte. Esta avaliação abrangerá os ambientes físicos e bióticos e incluirá um mapeamento das características do solo, das águas superficiais e das águas subterrâneas na região. O estudo de base envolverá uma revisão completa dos estudos relevantes sobre o assunto.

A norueguesa disse ainda que seu compromisso com o meio ambiente é universal e absoluto e que fez parceria com a equipe da Cruz Vermelha brasileira para fornecer atendimento médIco e diagnóstico de condições de saúde de famílias residentes em Vila Nova, Bom Futuro e Burajuba. A equipe da Cruz Vermelha já apresentou seu plano de ação. Inicialmente, o trabalho durará três meses, incluindo a coleta de sangue e amostras de cabelo para esses diagnósticos.

A Hydro também disse que se compromete a trabalhar com a comunidade, a sociedade civil e o governo para esclarecer as fontes de poluição da água e outros problemas relacionados à água na região de Barcarena.


Fonte: G1 PA

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