quinta-feira, 27 de abril de 2017

Morador de 80 anos expulso de seu lote em Barcarena foi preso e morreu deprimido



A relação entre as grandes multinacionais que atuam na Amazônia - sobretudo as ligadas à cadeia do ferro e do aluminío, como a Vale e a Norsk Hydro - e as pequenas comunidades, populações tradicionais e ribeirinhos, sempre foi tensa, às vezes agressiva. O problema está no fato de essas corporações capitalistas agirem como se fossem proprietárias da vida, da morte e dos direitos básicos das famílias mais humildes. 

Quando isso ocorre, cai a máscara da imagem de empresas preocupadas com as questões sociais e o meio ambiente das áreas onde implantam seus projetos. Nada diferente do Brasil feudal e dos velhos “capitães do mato”, só que hoje eles vestem paletó e gravata. 

Essas gigantes do dinheiro, para explorar as colossais riquezas minerais contidas no subsolo amazônico, principalmente no território paraense, chegam abençoadas pelo Estado - aplaudidas pelo discurso tentador da geração de emprego e renda, progresso e desenvolvimento -, compram terras públicas, usam a Justiça, às vezes de forma vergonhosa, para expulsar famílias, e se utilizam do aparato repressivo estatal, até mesmo da segurança privada, para impor regras que contrariam o modo de vida habitual das comunidades. 

Exemplo dessa violência, que indiretamente resultou na morte de um morador de 80 anos, foi o ocorrido com o sr. Laércio da Silva, a vítima. De posse de uma equivocada liminar a ela concedida pelo então juiz da Vara Agrária de Castanhal, Sérgio Ricardo Lima, já afastado do processo por suspeição – conforme matéria publicada ontem pelo Ver-o-Fato -, a empresa Vale, acompanhada de policiais militares e de um oficial de justiça, entrou na área e começou a exigir a retirada imediata dos moradores, dizendo que as terras eram dela. 

Laércio da Silva, um homem calmo e muito querido na comunidade, no momento em que os PMs e a Vale chegavam às proximidades de sua casa, capinava o terreno ao lado do filho, Josias da Silva, e mais dois sobrinhos, Brasil Jaques e Benedito. Após questionar que a liminar do juiz estava errada, porque sua família morava fora da área de 362 hectares reivindicada pela Vale, um representante da empresa disse que Laércio deveria “largar a arma que tinha na mão”, referindo-se a um facão com o qual o ancião de 80 anos limpava o terreno. 

A ameaça do "perigoso" 

“Arma pra você, que mora na cidade. Isso, pra mim, é ferramenta de trabalho”, respondeu Laércio. Imediatamente, os militares deram voz de prisão a “seu” Laércio, ao filho e ao dois sobrinhos, que foram levados para a delegacia de polícia de Barcarena. Lá, contra os quatro, foi lavrado um boletim de ocorrência e mais tarde instaurado um processo contra eles por crime de ameaça. 

Durante dois anos, Laércio e os parentes tiveram de comparecer ao fórum da justiça, a cada início de mês, para assinar um documento e responder a perguntas sobre suas vidas. Meses depois, o ancião entrou em depressão profunda, vindo a falecer. Seus familiares afirmam que ele vivia cabisbaixo e envergonhado pela humilhação que sofrera, pois sequer tinha antecedentes criminais. 

Esse senhor, considerado pela poderosa Vale como “perigoso”, era tão perigoso que doou parte do lote que ocupava para que fosse construída uma igreja cristã e uma escola municipal. Outros dois moradores, Nazareno Fernandes e Cláudio Baía, também foram algemados e levados presos por protestar contra a liminar expedida pelo juiz. 

Nas terras, hoje em poder da Norsk Hydro, que atua na cadeia do alumínio sob o nome de Hydro Alunorte, só existe um galpão e pequenas estruturas. Enquanto isso, o processo aguarda decisão de mérito na Vara Agrária de Castanhal.


Fonte: Ver-o-fato

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